21.5.11

solitude


Quando existe um conflito entre o caminho da vida que você está percorrendo e aquele que teu coração escolheu como bom, esse conflito básico acaba fatalmente consumindo as tuas energias vitais. Sorrateiramente. E, ao consumir tuas energias, ele, o conflito, esse monstro horroroso e sem face, também se alimenta da certeza que tem do teu fraco amor por você mesmo. Esse monstro, voraz, horroroso, se alimenta inicialmente das tuas forças, e quando tuas forças se acabarem, ele começa a se alimentar da tua fraqueza. Chegará um tempo em que nem mesmo a fraqueza vai te restar.

Esse conflito é um monstro sem face sorvendo teu mundo interior. Um monstro terrível e sem face, por isso não se deixa abater facilmente. É tão sagaz que tenta, primeiro, comer a tua própria possibilidade de percepção da existência dele.
Ave de rapina, transforma teu peito num campo devastado, tuas veias em coivaras, deixa curva tua espinha dorsal.
Avança sem trégua sobre tua alegria.
Implacável e seco, arrasa de vez com tua sensibilidade, põe teu entusiasmo em ponto morto, modifica teu conceito de prazer, assassina teu amor à liberdade.
Depois, ele vai comendo as tuas entranhas.
Vai comendo teu miolo, teu cerne, vai comendo tua personalidade, teu amor.
Ele primeiro comeu o teu subúrbio, tua periferia, tuas redondezas, tua superfície.
Mas agora ele quer o teu profundo, o teu centro, teu Eu.
Ele come quase tudo, come teu desejo, e vai comendo tua emoção, comendo aquele restinho de cor e de brilho que você ainda possa ter.
O desgraçado mata tua criatividade.
Mata tua poesia, teu sexo, teu romance.
Esse conflito é um monstro sem face sorvendo a tua força.
Ele primeiro se alimenta do teu ânimo, e depois come o teu cansaço.
Come o teu corpo — e depois devora o teu sossego, a tua paz.
Ele te abraça e te sufoca.
Mas nem toda tragédia tem que ser infinita. Há certamente uma saída, há uma solução:
— A solução é ser feliz.

Tornar-se feliz é o único meio de matar esse monstro sem face que te devora.

Acontece que para ser feliz é preciso antes ser livre. E só é livre quem pode dizer e praticar a verdade, a qualquer tempo, em todo lugar, sem medo. E só pode dizer e praticar a verdade, sem medo de represálias, aquele que é independente em todos os sentidos.
E aqui passamos a um novo nível de complicação.
— Porque nem todos amam suficientemente a Liberdade.
Nem todos nascem para ser livres.
Alguns têm necessidade neurótica de ser dependentes. Dependentes do outro, de fumo, de drogas, de sono, de remédios, de aprovação alheia — e até de companhia. Alguns, ingênuos, chegam convidar esse monstro horroroso para habitar seu pobre coração.
São os dependentes de amor...
Por definição, só quem faz da Lógica o primeiro suporte de todas as suas decisões; só quem reage com senso crítico em todas as circunstâncias consegue escapar das terríveis malhas da dependência.
Portanto, este raciocínio acaba nos levando à seguinte conclusão:
— Só os inteligentes conseguem ser felizes.
Só os inteligentes são capazes de matar esse monstro sem face.
Só eles podem, querem — e conseguem — ser livres.
Só eles podem se salvar.


Só os inteligentes se salvam.




O arqueiro tem que ser mais veloz do que a seta.