3.6.08

galope x trote

Era domingo. Era uma tarde chuvosa de domingo em que a vida virou uma encruzilhada: ou eu voava para longe dali em liberdade absoluta, ou me afundava salvando a relação. Era mais do que um dilema: era um projeto de vida fazendo água. E eu me sentia preso. Por isso, olhei fundo nos olhos dela e lhe disse com firmeza:

Não posso mais condicionar o meu galope ao teu trote.

Senti que ela entendeu a metáfora seca e a razão do meu cansaço. Meus olhos falsamente duros tinham que pôr distância entre os afetos.

Nossas velocidades haviam se tornado muito desiguais, e isso requeria solução imediata. Ela cambaleou, e os seus dezessete anos de vida, frágeis, adolescentes, tremeram todos — um a um. Quase desabaram ali, naquele cimento frio da cozinha. Ela sussurrou um agora inesquecível "eu te amo", meio desnorteada. Aquilo foi tocante.

Por dentro, amparei-a com amor, dei-lhe um abraço forte e terno, coloquei-a de novo no meu colo e cantei outra vez as canções de ninar que eu costumava lhe cantar.

Mas, por fora, virei um poste. Era preciso tornar-me gelo. Era preciso ser cruel. Era preciso fazer teatro. Mesmo porque nosso relacionamento já estava durando mais do que um relâmpago...

Então, a coitadinha embrulhou seus pequenos anseios num pano de prato e saiu chorando.

Nunca mais nos encontramos.

Acho que foi a maior injustiça que já cometi.